segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

"Vá, viva e transforme-se! "

"Vá , viva e transforme-se!! - foi com essa frase que a mãe do pequeno Salomão (Sholomo) ordenou que ele seguisse para Israel e assim salvasse sua vida do triste fim que aguardavam todos os refugiados da Etiópia naquele acampamento.


A trajetória de um garoto que sofre preconceito religioso, racial e étnico, se transformou em um dos mais belos filmes que eu assisti ao longo de todos esses anos. Não lembro de ter chorado tanto de emoção, de ter ficado com aquele nó na garganta durante quase toda a projeção do filme.


O final até poderia ter sido diferente, Sholomo, o protagonista da história, talvez se revoltasse com os infortúnios que a vida lhe proporcionou e, ao final, se tornar um terrorista. Mas não, agüentou as chibatadas do tempo e deu uma lição de vida ao se tornar médico para salvar os indivíduos menos afortunados com o destino.
Sholomo não escolheu onde ia nascer, o destino se encarregou de colocá-lo num dos piores lugares do mundo em termos de condições de sobrevivência. Nasceu, negro, pobre, cristão e etíope. Perdeu os irmãos, o pai, e por fim tinha acreditado que a própria mãe o tinha abandonado para viver nas mãos de brancos que testavam sua religiosidade, no caso o judaísmo, durante todo o tempo.
Sua mãe sabia o que estava fazendo ao entregar Sholomo a uma ‘segunda mãe’ para que ele tivesse alguma chance e sair daquele flagelo que assolava milhões na Etiópia. Essa ‘madrasta’, que o levou embora, era da tribo dos Falashas, judeus etíopes que são da linhagem da Rainha de Sabá e, conseqüentemente, tinham lugar garantido em Israel. E foi justamente nas mãos dos judeus, que têm toda um histórico de perseguição, que ele aprendeu o que é o preconceito.
Nesta segunda etapa de sua vida acontece o que ele menos esperava, sua segunda mãe morre, Sholomo fica a deriva e desprotegido numa terra desconhecida, onde agentes do governo israelense caçam falsos Falashas que se infiltram entre os verdadeiros para fugirem da fome que castigava a Etiópia. Ele conhece uma terceira mãe ao ser adotado, conhece também o que é ser diferente, o que é ser negro numa terra de maioria branca. Numa das cenas mais bonitas do filme, sua mãe israelense beija e lambe seu rosto para mostrar a outras pessoas que seu filho não era doente, e sim diferente.
O diretor Radu Mihaileanu demonstra uma grande sensibilidade ao enfocar a busca pela identidade. Talvez Radu tenha se inspirado na própria vida. O diretor saiu quando pequeno da Romênia para morar com seu tio na França. Além dessa busca do Eu, o filme capta os contextos daquela região do globo onde, apenas o fato de admirar um Deus com outro nome, é capaz de causar atritos que muitas vezes acabam em conflito bélico.
E é nesse contexto que Sholomo, já adulto, entra para o exército israelense como médico. Numa das cenas finais Sholomo é questionado por seu superior ao atender uma criança palestina que estava ferida, e que sua função ali era cuidar apenas dos soldados israelenses. “Entende?”, pergunta o seu superior ao final da conversa, mas Sholomo não entende o mundo pelo ângulo da diferença. Ninguém consegue entender até hoje. E a frase de Jesus no começo do texto sobre perdoar o próximo, mesmo quando esses afetam os interesses individuais e coletivos, fica sem sentido num mundo rancoroso e cheio de preconceitos. (Fonte: Luiz Carlos Filho)

O titulo nacional dado ao filme Um Herói de Nosso Tempo não faz jus à beleza dessa jornada de superação e inacreditável emoção contida nas atuações impecáveis de todo o elenco.

Prefira o título original em francês que dá nome a esse post "Vá, Viva e Transforme-se"...

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